Desde bebê percebemos que algo estava fora do controle com o nosso filho. Ele era extremamente agitado, chorava muito, dormia pouco, mamava com ferocidade, regurgitava de forma exagerada, tudo nele era fora do padrão desde muito cedo….Aos 7 meses procuramos homeopatia como forma de acalmá-lo e podermos dormir algumas poucas horas por noite…..sem êxito. Aos dez meses ele não andava……corria, colocamos em uma escola infantil muito preparada na esperança que ele fosse ficar cansado com as atividades; novamente sem êxito. Com um ano de idade, a psicóloga desta escola disse que talvez ele fosse hiperativo. Que susto!!! Nunca havíamos ouvido esta palavra. Como mãe foi aí que começou a minha corrida atrás de informações. O pediatra me ajudou muito, mas toda informação era pouco, pois a cada dia ele apresentava algo novo nas façanhas. Aos 3 anos de idade ele já fazia psicoterapia, pois o irmão de um ano era vítima constante dos seus momentos impulsivos. Também foi nesta época que iniciou a natação, momento em que pela primeira vez dormiu uma noite inteira (ao acordarmos e darmos conta de que não levantamos nem uma vez a noite toda, por um momento pensamos que ele havia morrido durante o sono). Aos seis anos, na alfabetização, eu era informada todos os dias de que ele não acompanhava a evolução conforme as outras crianças, embora sempre muito esperto e participativo. Nesta fase, já havíamos consultado muitos neurologistas de onde saíamos frustrados com informações do tipo vamos dar calmante ou “mãe você não está sabendo educar seu filho, ele precisa de limites”, e assim perambulando de um consultório a outro, chegamos a uma psiquiatra infantil. Por que não fomos a um psiquiatra antes? Porque sempre que ouvíamos esta palavra ficávamos muito assustados e a resposta já estava pronta: “ Nosso filho não é louco”…. Hoje, como mãe e profissional da área de Psicologia entendo perfeitamente quando os pais relutam em procurar ajuda em um profissional específico, eu e meu marido também relutamos, não tínhamos o entendimento amadurecido quanto a esta necessidade, falar em medicamento era algo muito assustador (eu era administradora de empresas e meu marido profissional de marketing). A sete anos atrás, fui estudar Psicologia em busca de entender e compreender os comportamentos do meu filho, porque no mais ele era dez. Então vamos logo separar o que é a pessoa e o que é o seu comportamento …)Bem, resumindo a historia, no primeiro dia que nosso filho tomou o medicamento para TDAH, no momento de dormir, quando sempre fazíamos a oração juntos, ele disse: “Papai do céu, muito obrigado por este remédio, porque eu descobri que não sou burro”. Ora, ele tinha apenas sete anos, e já era rotulado como burro, avoado, distraído, estabanado, etc, etc, etc. Na escola, nos encontros familiares ou em qualquer lugar, ele sempre era a atração, sempre se envolvia em enrascadas, liderava as travessuras e por consequência, também era responsabilizado mesmo que não tivesse a participação em algo que deu errado mas que ele estava por perto. Nem tudo foram flores quanto ao uso do medicamento, pois em alguns momentos houve recusa por parte dele, outras vezes colegas o chamavam de retardado e assim sempre a psicoterapia tendo um papel essencial de informá-lo e conscientizá-lo da necessidade e importância de tal medicação. Aos poucos, ele foi se dando conta de que os amigos estavam ficando mais próximos (sim, porque antes ele não era bem vindo, os atos de impulsividade assustavam e afastava as pessoas dele, e de nós também, inúmeras vezes percebemos claramente o quanto a nossa presença era indesejada devido á maneira que ele se comportava nas festas, nos encontros). Na escola, sempre houve grande dificuldade porque nem sempre os professores estão aptos ou com vontade de entender ou se dispor a ajudar. Também o comportamento dele muitas vezes além de distanciá-lo das crianças fazia com que os pais o desejassem bem longe de seus filhos, não os culpo, eles não entendem, como um dia eu também não entendi. Posso apenas resumir que em quatro anos, ele passou por cinco colégios diferentes, porque sempre precisamos de auxilio pedagógico, precisamos que ele faça provas orais quando não consegue ir tão bem à prova escrita, pois entender o conteúdo já é difícil, transpor este conteúdo de forma descritiva é outra dificuldade a ser superada, precisamos que ele tenha mais tempo para terminar as tarefas, sem contar nas intermináveis vezes que eu saí de casa correndo para levar a lição ou o livro que ele esqueceu em casa. Também preciso lembrar-me de quantos materiais escolares ele perdeu e perde até hoje, além de casacos e objetos em geral, pois ele tem o TDAH do tipo combinado, ou seja, hiperatividade, impulsividade e déficit de atenção. Há cinco anos conhecemos a ABDA, e daí também surgiu uma nova vida pra ele e pra nós como família, ouvir a nossa história narrada por outras pessoas, sim, porque a história sempre parece ser a mesma, em cada relato a gente se reconhece, são as mesmas dificuldades, anseios e angústias, todos vivem o mesmo drama, a mesma incompreensão. Participar destes encontros e ser pertencentes a este grupo que trabalha em prol de acolher, informar e orientar sobre o TDAH foi nos dando conforto em perceber o quanto estávamos sendo beneficiados pelo aprendizado dos profissionais e dos participantes desta ONG. É muito importante o envolvimento da família como parceiros no tratamento de quem tem TDAH, eles precisam ser compreendidos e apoiados. Eu agradeço profundamente meu segundo filho pela compreensão e participação e por dividir a sua infância com as dificuldades do irmão. Nosso filho tem hoje 16 anos, toma medicamento e faz terapia, sabe o quanto isto significa pra ele, tem muitos amigos, é querido, é esportista nato e adquirido porque sempre procuramos incentivá-lo em quantos esportes ele quisesse se ingressar, sempre pensamos em transformar esta hiperatividade em algo muito eficaz, ele participa de torneios e campeonatos de tênis, futebol, natação, pratica bicicross, anda de skate, já fez judô, caratê e boxe. Nunca repetiu um ano escolar, o colégio em que está hoje o adapta de forma que ele possa corresponder e nós como pais aprendemos a enxergá-lo da forma que ele é, uma pessoa maravilhosa, de bom caráter e boa personalidade e que tem um comportamento às vezes inconstante. Ele aprendeu que não é melhor nem pior que os outros, tem todas as características de um jovem na plena maravilha do auge dos 16 anos, com muita expectativa nos seus objetivos, e o que é melhor, não tem vergonha de si, nunca se recusa a falar sobre o transtorno, dissemina informações, trata com naturalidade o medicamento e a terapia, tem ótima auto-estima e é feliz. Esta é a história do Emanuel………..conte a sua também