Meu primeiro filho chegou com muita expectativa. Éramos ainda muito jovens quando ele chegou e este fato só veio agravar ainda mais a situação que viveríamos em um futuro próximo. Ele sempre se demonstrou muito agitado, dormia poucas horas tanto durante o dia, quanto à noite. Subia em todos os móveis possíveis e impossíveis de nossa casa e das casas que visitávamos, mexia em tudo… Assim, cada vez mais foi se tornando totalmente inconveniente sair com ele para outros lugares senão a casa dos avôs, que tinham total tolerância. Não parava nem para comer, saíamos com o prato atrás dele no desespero para que se nutrisse… Quando precisamos colocá-lo na primeira escolinha (2 anos), por nossa necessidade de trabalho, logo percebemos que ele era considerado pelos professores como uma criança que dava \”trabalho\”, pois não se sentava nas rodinhas ou atividades propostas, tomava os brinquedos e geralmente batia nos colegas. Quando a situação ficou insuportável fomos chamados pela escola e nos sugeriram, que não estaríamos colocando os limites necessários ao nosso filho. Nesta época nós já nos sentíamos consumidos pela culpa, pois achávamos que não sabíamos educar e cuidar adequadamente dele, por sermos inexperientes e também não faltava quem apontasse isto, como o motivo das atitudes mal educadas dele. Passamos por diversas psicólogas e ninguém conseguia nos ajudar efetivamente, o problema na escola continuava, pois sempre que passávamos por lá, freqüentemente o víamos através das grades, na quadra da escola de \”castigo\”, sem poder brincar com os coleguinhas. Até que decidimos mudá-lo de escola, mas pouco tempo depois aos cinco anos, os mesmos problemas de relacionamento e de \”indisciplina\” começaram a surgir. Aos 6 anos de idade, resolvemos novamente buscar uma outra sugestão da escola, que nos orientou a consultar um neuropediatra. A partir desta consulta, nossos horizonte foram se ampliando, havia uma explicação para aquela \”tempestade\” sobre nossas vidas, finalmente nosso ideal de família poderia ser reconstruído, pois agora sabíamos que havia uma resposta para tal comportamento, não era porque não soubemos educá-lo com limites, apesar de sempre nos esforçarmos para tal, não éramos fracassados como pais, simplesmente ele não conseguia absorver o que ensinávamos, porque ele não conseguia prestar atenção nas regras, tanto de convívio social quanto aquelas previamente combinadas com ele. Ele não dava conta de enxergar como o mundo funcionava. O neuropediatra não nos prescreveu inicialmente nenhum medicamento, ele primeiramente nos prescreveu livros, para que nos apropriasse do assunto e concluíssemos se o quadro correspondente ao TDAH, realmente era compatível com o que nosso filho e nossa família viviam. Demoramos nove meses (tempo de uma gestação), para buscar todo o conhecimento através da literatura comum e científica, pesquisamos muito e não havia como negar que o quadro do nosso filho realmente era compatível com o descrito no TDAH. Mas a necessidade de uso contínuo de uma medicação, ainda era um ponto que causava muita resistência da nossa parte. Quando finalmente retornamos ao neuropediatra, nosso filho já estava com 7 anos, após esclarecimentos específicos sobre a medicação, decidimos iniciá-la conforme prescrição médica. Neste tempo ele ainda não havia conseguido se alfabetizar, apesar de ser extremamente inteligente para outras coisas e de receber acompanhado próximo de sua professora, que era extremamente interessada e envolvida com sua especificidade. Após o uso da medicação, durante exatamente um mês, retornamos ao médico com os relatos de sua melhoria na escola e em casa e com a feliz notícia de que ele havia conseguido se alfabetizar neste período! Percebemos mudanças extremas e também sutis em seu comportamento, ao longo dos primeiros meses de tratamento adequado. Mudanças que até hoje fazem toda diferença na vida de nosso filho e conseqüentemente em nossas vidas. Ele pôde ir superando gradativamente o que havia perdido em seus sete primeiros anos de vida: a autoconfiança, a confiança e respeito das pessoas e a liberdade de se relacionar na escola, na família e no mundo, sem perigo de minar estes relacionamentos, sem nem sequer perceber, sendo julgado e ferido constantemente. Sem mencionar a autoconfiança nos estudos e em sua capacidade intelectual, ele realmente passou a confiar que era inteligente! Nós como família também tivemos as nossas culpas afrouxadas, pois nos conscientizamos que muitas atitudes de nosso filho, estavam ligadas a impulsividade e hiperatividade e não a uma falha em seu caráter ou personalidade, causado por uma educação deficiente da nossa parte. Atualmente com 13 anos e meio, nosso filho mantém o tratamento medicamentoso e teve alta da terapia. Tornou-se um dos melhores alunos, de um dos melhores colégios de nossa cidade. Consegue fazer e manter alguns bons relacionamentos com amigos na escola e em outros espaços de convívio social. Na família as relações passaram a ser menos conflituosas ou desgastantes, proporcionando maiores oportunidades para momentos de afeto e diálogo. Sabemos que o caminho da vida é longo e que muitos são os desafios que ainda teremos de enfrentar, tais como a adolescência, vestibular, primeiro emprego, casamento e constituição de família, são algumas das situações pela qual ele deverá passar, mas agora com menos desvantagens e maiores oportunidades, em relação a maioria dos indivíduos, quantos ao modo de enfrentamento.