Tenho 49 anos, sou casado pela segunda vez, sou carioca,. Como falar de mim ? É difícil até pra mim saber o que eu fui, o que sou. Cresci ouvindo: “Você é preguiçoso”; “Você é burro”; “Você é avoado”; “Você é arteiro”; “Você é isso ou aquilo”… Ou seja, sempre havia um adjetivo pejorativo vindo de alguém da família ou de um professor. Na escola perdi a conta das aulas de recuperação, das particulares e das repetências. Da vergonha! Cresci no meu mundo de fantasias, de amigos imaginários pois os amigos reais nunca consegui cativá-los. Cresci no mundo das surras que meu pai me dava pelo meu jeito irrequieto, pelos meus esquecimentos, pela minha falta de atenção.Lembro de me levarem , ainda adolescente a um médico, onde sem me explicarem nada, fui responder a alguns testes do tipo: O que você esta vendo nestas figuras? Monte estes desenhos e faça estes exercícios .Sai de lá com uma indicação , tomar Nootropil.. Tomei por um tempo, mas creio que por “ignorância” da família , não foi pelo tempo necessário. A adolescência não foi fácil, as dúvidas , os fracassos, a vergonha, os receios , a desorganização, os medos só aumentavam. As trocas de letras, a impaciência em ler o texto inteiro. O pensar uma coisa e dizer outra . Fase adulta chegou e com ela as responsabilidades e os fracassos, desde as diversas universidades abandonadas, as mudança de setores no trabalho, a impaciência e impulsividade nos comentários nas reuniões, as relações pessoais conflitantes, uma compulsão sexual, um descontrole alimentar, esquecimento de tarefas, dispersão no pensamento com qualquer som, e a total impaciência com a família. Ouvia das pessoas observações do tipo: Você precisa procurar um psicologo! Esta sua instabilidade de humor não é normal! Vamos sair, não vou deixar você passar mais um fim de semana neste sofá vendo TV (se deixassem eu ficaria a semana sentado no sofá). Não entendia, não percebia, não enxergava, não compreendia o que me falavam, achava que minha esposa era implicante. Resultado: brigas! Aos 48 anos, assistindo ao programa Sem Censura, onde o entrevistado era o dr. Paulo Matos eu me encaixei dentro de todas as suas colocações e disse naquela tarde: Eu sou isso!.. Eu sou TDA! Tomei coragem e investi em descobrir o que acontecia comigo, o que e quem sou eu? Afinal não poderia e não aguentava mais, viver naquele sistema que desenvolvi, o famoso FOD…. (Quem gostasse de mim , gostaria como Eu era). Não vou mentir e dizer que os testes foram fáceis e nem deveriam, me viraram ao avesso, sacolejaram a minha mente. Diagnosticaram, aconselharam e me direcionaram. Hoje eu digo a minha psicologa cognitiva , minha neuropsiquiatra e a minha esposa que existem dois Marcello … Um MAP e um MDP , ou seja, Marcello Antes do Portão da Clinica do Medico e um Marcello Depois do Portão. Não me adaptei ao primeiro medicamento e depois de mudar as dosagens me via irritado em no fim do dia. Ao conversar com a neuropsiquiatra mudamos o medicamento e tudo se estabilizou, hoje tomo um que dura 13 horas. Percebo as mudanças, consigo acompanhar as reuniões e me manter focado no trabalho. Ainda não consigo estudar ou me manter focado na Faculdade. Ainda esqueço demais , mas sei que não é por burrice. Ainda não controlei a impaciência em esperar ou aguardar por algo ou alguém. Mas, já consigo detectar e vencer meus dogmas, meus TOCs e deixar de ser impulsivo o famoso “boi de piranha” nas reuniões de trabalho. Não foi e não é fácil viver fora do campo de força que criei, sem o pisca alerta do FOD….! Afinal já tinha me adaptado neste sistema de proteção, mas depois de meses de terapia cognitiva descobri como magoava as pessoas e a mim. Tenho lido muito sobre o assunto e aconselho que façam o mesmo, hoje , diferente de quando eu tinha 12 anos, temos diversos sites, associações, testemunhos e livros sobre o TDAH. Gostaria apenas de acrescentar que é uma batalha diária de convencimento pessoal de que não devo largar a medicação e o acompanhamento psicológico apesar dos comentários externos ao meu meio. Nenhum remédio é milagroso, nenhuma terapia é a salvação, um não funciona bem sem o outro. Somos uma equipe : Eu, remédio, psicologo e a família.