RELATO DE MARIA
O nome utilizado neste relato é Maria, para preservar a identidade de nossa filha. 
Desde o nascimento, Maria demonstrava ser uma criança impaciente, deixava claro quando havia algo que a incomodava, chorando aos berros, pulava o tempo todo, parecia ter molas nos pés. Não dormia a noite toda, acordava de hora em hora e era difícil saber o que estava faltando para dar-lhe conforto. 
Com o passar dos três primeiros anos, notava-se que o limite era o teto, pois subia nos móveis, armários, via o mundo de cabeça para baixo grande parte do tempo, transpirava demais e as roupas a incomodavam. 
Ao iniciar o período de alfabetização, trazia as tarefas para casa, mas nunca conseguia terminá-las, levantava o tempo todo, ora para tomar água, ora para ir ao banheiro. Outras vezes, parecia no mundo da lua e se distraía até com mosquitos que passavam por perto.
No início da infância, passou por um período de gagueira, parecia querer falar na velocidade de seu pensamento. Tinha dificuldades em seguir regras, perguntava e falava demais, atropelava a conversa dos adultos e não parava nem para comer, o prato tinha que acompanhá-la. Os dias pareciam uma corrida contra o tempo.
Na segunda série do ensino fundamental identifiquei que era preciso fazer algo, pois o caderno voltava vazio e a professora da escola municipal fazia o possível com um grupo de cinqüenta alunos. Foi então transferida para a rede particular de ensino na terceira série. 
As dificuldades aumentaram, pois a perda de conteúdo didático trouxe muitos prejuízos, sendo necessário iniciar o reforço escolar. Ao iniciar o segundo ciclo do ensino fundamental, a situação estava crítica, não sabíamos se a tal dispersão era devido ao fato dela não gostar de estudar, preguiça ou algo que não sabíamos o que era.
Na sétima série, tivemos o caminho iluminado, pois uma nova Coordenadora Pedagógica da escola aconselhou a levá-la ao neurologista, pois percebia nela uma dificuldade e não uma displicência. Seguindo esta orientação, procuramos um especialista que após as avaliações clínicas e exames, nos deu o resultado: Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade de grau acentuado, prescrevendo medicamento .
Nesta época, o baixo rendimento escolar já havia deixado marcas na vida de Maria que entrou em depressão e teve que interromper o tratamento, sendo encaminhada à psiquiatra para fazer uso de antidepressivo.
Na escola, pedimos ajuda no sentido de que a mesma aplicasse alguma avaliação diferenciada, visto que na época Maria fazia aula extracurricular para reforço, o que não aconteceu, visto que a Coordenadora dizia que não podia criar um processo de discriminação com a aluna.
Na verdade, a discriminação já existia e a grande perda de conteúdo aumentava mais ainda a distância entre ela e os outros alunos. 
Sugerimos a Maria. mudança de escola, mas a mesma tinha tanto receio de aumentarem as dificuldades que achou melhor ficar onde estava. Após melhora da depressão, a psiquiatra introduziu novamente o medicamento para TDAH, na tentativa de nova adaptação.
Na primeira série do ensino médio o conselho de classe reunido no final de ano queria reprovar por unanimidade Maria. 
Diante de todos os relatórios médicos encaminhados à escola, inclusive da professora que dava aulas particulares de reforço, procuramos orientação na Delegacia Regional de Ensino, que orientou a protocolar o pedido de revisão das notas, visto que é um direito do aluno com TDAH ter uma avaliação diferenciada.
Assim procedemos e a Diretora da escola assumiu o compromisso de passá-la de ano. Mudamos Maria de escola e ela concluiu o ensino médio numa instituição com abordagem pedagógica mais dinâmica e moderna, com muitos recursos áudio visuais, aulas multidisciplinares, mais interativas, deixando para trás rótulos e estigmas. 
Aos 17 anos, a médica identificou, após longo período de acompanhamento, o transtorno do humor ou transtorno bipolar.
No decorrer destes anos, encontramos muita ajuda tanto dos profissionais que a acompanharam, principalmente da médica psiquiatra, quanto dos artigos que encontramos no site www.tdah.org.br, além do livro que ganhamos de presente da médica, de autoria do Dr. Paulo Matos, No Mundo da Lua. 
Hoje, ela tem 20 anos, cursa o primeiro ano da faculdade de Direito, fechou o ano letivo com a aprovação em todas as disciplinas e a vitória maior: sem a medicação que precisou durante os primeiros anos de tratamento, pois reaprendeu a estudar, estabeleceu uma rotina e gosta do que faz. Hoje nos questionamos se a mudança de escola tivesse ocorrido logo no início da identificação do TDAH, para outra com abordagem mais interativa e professores mais preparados, talvez ela não tivesse perdido tanto conteúdo didático. 
Gostaríamos de parabenizar o excelente trabalho fornecido pela equipe da ABDA, pois a falta de esclarecimento é semelhante ao caminhar no escuro. 
Desejamos aos que iniciaram recentemente a caminhada para o entendimento do TDAH, que não desistam da busca por informações e troca de idéias com pessoas que também possuem o transtorno e compartilhamos alguns aprendizados:
– Não rotule seu filho e não permita que ninguém o faça;
– Antes de iniciar o tratamento, tenha a certeza de que a criança/adolescente foi avaliada, de preferência por um bom psiquiatra, com apoio psicológico e psicopedagógico, além de reforço escolar e principalmente apoio familiar;
– Avalie se a escola que o filho estuda tem uma abordagem didática que permita à criança desenvolver-se.
A escola ou o professor que enxerga seu filho como parte de uma massa estudantil, que deve cumprir os mesmos requisitos que os demais, com muito conteúdo didático e pouco acolhimento, pode prejudicar muito o processo de aprendizagem e sabemos que o baixo rendimento escolar prejudica a criança em todos os aspectos.
Existem muitas escolas que fazer a propaganda enganosa da falsa inclusão.
A criança com TDAH precisa de métodos coerentes, professores dinâmicos e abertos à realidade atual, que colocam em prática a Lei das Diretrizes e Bases da Educação.
Boa sorte a todos!
Grande abraço!
Maria de Lurdes