Paulo Bitencourt, jornalista e portador de TDAH.

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Marcinha (nome fictício) tem hoje 7 anos. Distraída e avoada, freqüentemente passeia pelo “mundo da lua”, sonhando com seres imaginários e com mil fantasias na mente. Gosta de desenhar e é muito meiga e carinhosa. Com as irmãs mais velhas, porém, estava sempre em desvantagem, não pela idade inferior, mas pelo seu temperamento bonachão, passivo e desarmado. As outras sempre lhe pregavam peças, pois estava sempre distraída e despreparada. Fazem piadas, joguetes e provocações para testar a atenção e a presença de espírito de quem estiver por perto. Algumas crianças não sabem lidar com este tipo de jogos e estão sempre perdendo, formando um conceito interno de “molenga”, “boba”, “retardada” e outros adjetivos semelhantes. Gradualmente, desde a tenra infância, vão-se acumulando, camada após camada, rótulos de incompetência pessoal em relação aos outros. O autoconceito formado é de inadequação, inferioridade, incompetência, etc. A auto-estima é destruída, ou nunca se forma. A criança cresce tímida, inibida, inferiorizada e com dificuldades de ajustamento que vão durar por toda a vida.

O que Marcinha tem foi diagnosticado, recentemente, como Transtorno do Déficit de Atenção, ou, conforme a sigla, TDAH. Este transtorno já foi motivo de centenas de estudos científicos em todo o mundo. De modo semelhante, existem outros distúrbios causados por mau funcionamento químico dos neurotransmissores. Desde os anos 70/80 do século passado a Psiquiatria sofreu uma retumbante transformação. O conhecimento do funcionamento do cérebro era ignorado, pois predominavam as teorias da “mente”, principalmente a Psicanálise. Como não se conhecia o funcionamento do cérebro, os teóricos agarraram-se às hipóteses sem comprovação e ao “achismo”, mas sem curas. Hoje, o cenário inverteu-se: os psiquiatras abandonaram estas teorias e passaram a estudar o funcionamento físico-químico do cérebro, descobrindo porque uma criança, como Marcinha, é distraída e avoada: uma deficiência química, de causa genética!

Marcinha está diagnosticada corretamente. Sua mãe entendeu e aceitou a orientação médica e já está vendo os resultados positivos. Uma medicação específica para balancear o desequilíbrio químico do cérebro de Marcinha está permitindo que ela tenha uma capacidade de concentração semelhante à de outras crianças e não fique mais voando, distraída, sendo alvo de pilhérias e humilhação. Sua auto-estima está crescendo e progride na sua integração social. O melhor de tudo é ver que a felicidade está estampada no seu rosto, porque agora ela tem desempenho equivalente ao das demais crianças e não é mais segregada. O acompanhamento médico é mínimo, apenas para avaliação. Nem mesmo terapias cognitivas, aulas particulares, ou turmas especiais no seu caso.

Marcinha está encontrando o caminho da integração social neste mundo exigente e hostil, graças a um medicamento e uma orientação segura e atualizada, por um psiquiatra que abandonou as teorias do passado e estuda a ciência do presente. Marcinha tem um bom prognóstico. O palpite é que conseguirá integrar-se socialmente e aprenderá a conviver com o seu desequilíbrio químico natural. Enquanto isto, milhões de outras crianças ainda estão condenadas a sofrerem humilhações e serem rotuladas como incapazes, inferiores ou – pasmem –, como estúpidas ou burras, sem futuro, etc. Por este motivo, este esforço de divulgar informações científicas atuais e comprovadas, para que mais e mais indivíduos alcancem uma melhor qualidade de vida.

 

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