O TDAH no adulto e o processamento das emoções

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Por muito tempo o TDAH foi considerado um transtorno da infância. Somente nos anos 90 se estabeleceu definitivamente a persistência do transtorno na vida adulta. A desatenção é o sintoma que frequentemente persiste na idade adulta, podendo haver uma redução da hiperatividade e da impulsividade. 

Os sintomas do TDAH na fase adulta podem ocasionar prejuízos no trabalho, nas relações sociais e amorosas, problemas com condução de veículos, drogas, crimes, imagem corporal, autoestima e queixas de dificuldades com a memória, dificuldades com lazer, espiritualidade, segurança, relações sexuais, ambiente familiar…

Estudos recentes sugerem que se inclua a desregulação emocional como sendo um sintoma fundamental no TDAH adulto. A emoção conglomera processos de avaliação, sensação física, comportamento motor, intencionalidade e expressão interpessoal; desempenha a função básica de auxiliar uma pessoa na avaliação de alternativas, ao oferecer motivação e revelar necessidades e perigos. Portanto, regular as emoções representa uma habilidade fundamental para a interação social.  

Desta forma, a desregulação emocional pode ser definida como a dificuldade ou inabilidade de lidar com as experiências ou processar as emoções, podendo se manifestar como intensificação excessiva ou como desativação das emoções.

Para regular as emoções, o indivíduo necessita usar estratégias para enfrentamento das mesmas, quando este se depara com a intencionalidade emocional indesejada. Autorregulação das emoções seria como um termostato homeostático que regula e mantem as emoções em níveis controláveis.  

Dada a relevância das emoções como moduladoras do comportamento e de sua interpretação, é possível inferir a importância de sua alteração patológica, ou seja, a Desregulação Emocional. Tanto a intensificação excessiva, que pode ser sentida pelo indivíduo como indesejada, resultando em pânico, terror, trauma, temor ou senso de urgência, de forma que o indivíduo se sinta sobrecarregado e com dificuldade de tolerar tais emoções, como a desativação excessiva de emoções, podem impedir o processamento emocional adequado, criando um tipo de enfrentamento caracterizado pela esquiva.

Bornstein2Entre muitos sintomas característicos do TDAH no adulto podem-se agrupar três categorias de muita importância: baixa inibição, baixo autocontrole e problemas nas funções executivas, sendo estes grupos interrelacionados. A baixa inibição estaria relacionada à dificuldade do indivíduo parar e pensar no ato antes de fazê-lo, agindo assim com impulsividade. O autocontrole são reações dirigidas a si, ou ao seu comportamento que poderia ajudar a “fazer” algo diferente do que o impulso manda. A função executiva se refere às ações autodirecionadas que são usadas para o controle, sendo eles inibição, memória de trabalho, planejamento e atenção, e controle emocional. Sendo assim, os indivíduos adultos com TDAH apresentam reações emocionais impulsivas em diversas situações justamente porque eles têm dificuldade de autocontrolar a reação inicial, e também usar de ações direcionadas e autodirigidas que os ajudariam a acalmar as emoções. Ou seja, a autorregulação é um importante mecanismo para guiar, moderar a emoção e organizar a ação. E tendo dificuldade de inibir as emoções, o indivíduo com TDAH apresenta baixa tolerância à frustração, impaciência e baixo controle cognitivo. Adultos diagnosticados com TDAH geralmente vêm de uma infância marcada por dificuldades, expressam um comportamento bastante mal adaptado e deveriam ser reconhecidos como indivíduos que, por definição, lutaram com dificuldades psicossociais duradouras. 

Embora o TDAH venha sendo estudado há anos através do foco na dificuldade cognitiva, a perspectiva da regulação da emoção parece que pode levar a uma melhor compreensão deste transtorno. O adulto com TDAH frequentemente sofre de oscilações do humor que podem ser pequenas contrariedades ou mesmo ocorrências menores, sem importância, do cotidiano.  Além de alterações de humor, os portadores de TDAH podem perder o interesse rapidamente pelas coisas e precisam de novidades para se sentir estimulados, revelando uma mistura de incapacidade em manter-se com energia e disposição suficientes para  sustentar algo, ainda enfrentando a inquietude própria do transtorno. Mudam de planos constantemente, na maioria das vezes sem prévia consulta aos outros, o que gera muitos conflitos nas relações. Por terem dificuldade de monitorar seu próprio comportamento, avaliam as consequências de seus atos somente depois que já praticaram a ação.  

 

Tratamento

 

O tratamento do TDAH deve ser multimodal e inclui orientação, tratamento psicoterápico e uso de psicofármacos. O tratamento da Desregulação Emocional no TDAH deve colaborar para que a pessoa desenvolva hábitos e capacidade de tolerar suas emoções, a fim de lidar melhor com os desafios do cotidiano.

A Terapia Cognitivo Comportamental (TCC) é hoje a mais indicada para o tratamento do TDAH por ser vista como um conjunto de intervenções relevantes para a regulação emocional, pois inclui orientação e técnicas que colaborem na modificação de comportamento, na estruturação do ambiente, no planejamento de atividades e no manejo de sintomas.  

Esta abordagem de psicoterapia busca propor que não é a situação que determina o que as pessoas sentem, mas o modo como interpretam a realidade à sua volta. Sugere também que o pensamento distorcido pode influenciar o humor e o comportamento do indivíduo. Sendo assim, o terapeuta auxilia o paciente a descobrir não só os eventos do ambiente que determinam os comportamentos-problemas, mas também a identificar e atuar sobre o que mantém estes comportamentos, como os pensamentos distorcidos.

A TCC utiliza lineamento de habilidades sociais, conversação, resolução de conflitos, controle da raiva, estratégias específicas que reforce o comportamento adaptativo social e diminua ou elimine o comportamento desadaptativo, por exemplo, através de técnicas de reforço positivo. Tais técnicas podem ajudar a diminuir as deficiências no dia a dia e administrar os sintomas, tornando os comportamentos desadaptativos menos frequentes e desta maneira menos estressantes.

A reestruturação cognitiva é uma eficaz estratégia “antecedente” de regulação emocional, pois modificando a interpretação dos eventos, o indivíduo pode efetivamente reduzir o impacto emocional.

Partindo do entendimento da neurobiologia das emoções e do seu papel na etiologia de diversos transtornos psiquiátricos, a Regulação Emocional surge então, no contexto da psicoterapia como um conjunto de habilidades adaptativas, que inclui a capacidade de identificar emoções e compreendê-las, controlando a emergência de comportamentos impulsivos e possibilitando o uso de estratégias adaptativas para ajustar a resposta emocional.

 

Denise Ferreira Ghigiarelli – Psicóloga Clínica-CRP 06/107690

Especialização em Terapia Cognitivo Comportamental-HCFM-USP

 

Bibliografia / referências